Maxson Savelle: Negra, a carne mais barata do mercado
- Por Maxson Savelle
- 27 de abr. de 2017
- 5 min de leitura
Maxson Savelle Alexandre Silva, apelido? 'Nêgo!' – Na infância e juventude sentia vergonha desse apelido. Ele me remetia a uma coisa ruim, me sentia inferior. Corri para os livros querendo saber o que isso significava. Fui entendendo que além do apelido, eu era negro na pele. Percebi pelos relatos e pela televisão que eu não tinha muitas chances de ser alguém na vida, morar na periferia próximo do mundo do crime e esgoto a céu aberto fazia com que passar dos 25 anos fosse um milagre. A matança de jovens negros na última década aumentou assustadoramente, vejamos:
“Morrem 153,4% mais negros do que brancos por homicídios no Brasil. Os números do estudo Homicídios e Juventude no Brasil, do Mapa da Violência 2013, mostram a brutal desigualdade na violência no País. [...] 71,4% das 49,3 mil vítimas de homicídios em 2011 eram negras – o que corresponde a 35,2 mil assassinatos”. Ambos os números foram os maiores registrados desde 2002. Há 12 anos, por exemplo, morriam 42,9% mais negros do que brancos. Em 2010, esse número já havia atingido 149%. O valor máximo até o momento, de 153,4%, também foi o último registrado, em 2011.
Somente na vida adulta eu consegui entender o motivo desse sentimento, misturado com o olhar de medo da senhora que atravessou a rua ao me ver, dos passos seguidos pelo segurança da loja, e depois de ser barrado na instituição que estudei por 3 anos (enquanto outros jovens entravam sem apresentar nenhum documento ou precisar explicar o que queria), eu pude entender que o Racismo estava sempre presente na minha vida e comecei a ter uma consciência da minha história e valor diante da vida. O tempo passou, cheguei e passei dos 25, 27 anos, contrariei as estatísticas, superei muitos traumas, mas o Brasil continua racista e perseguidor, com nossas crianças principalmente.
Março de 2017, cidade de Samambaia, Distrito Federal (Brasil), Numa creche pública que atende 136 alunos, todos os dias as crianças tomam banho com a ajuda de monitores, antes de voltar para casa. Na hora de lavar o cabelo das crianças a professora disse que não lavaria o de uma delas porque era duro. A menina de 4 anos, era a única criança negra da turma, chegou em casa chorando, dizendo que não quer mais voltar pra a escola, agora foge das pessoas e pede para a mãe alisar o cabelo. Uma atitude racista que afetou profundamente a infância e a vivencia escolar da criança.
“Tinha sete anos apenas, apenas sete anos. Que sete anos! Não chegava nem a cinco! De repente umas vozes na rua me gritaram: Negra! [...] E odiei meus cabelos e meus lábios grossos e mirei apenada minha carne tostada. E passava o tempo, e sempre amargurada. Continuava levando nas minhas costas minha pesada carga. E como pesava! Alisei o cabelo, passei pó na cara e entre minhas entranhas sempre ressoava a mesma palavra, Negra![...]” _ Victoria Santa Cruz (Poeta peruana) Poema no Youtube: GRITARAM-ME NEGRA
A consciência negra que precisamos ter
Nós precisamos ter consciência da nossa história, contribuição e importância. Ter consciência de que nós negros nunca recebemos a libertação. A escravidão “acabou”, mas hoje somos assassinados, descriminados e marginalizados por uma sociedade que excluir e humilha. O poder nas instituições é branco e racista. Ter consciência de que hoje as políticas de cotas afrontam o reinado dos racistas. Ter uma consciência negra não é complexo ou racismo reverso, não é vingança, separação ou ódio é um anseio legitimo de redenção de um povo. Não devemos nos envergonhar da nossa pele, de ser negro.
“Eles redigiram isso em linguagem, eles fizeram tudo que é Negro parecer feio e ruim. Olhe em seus dicionários e veja, os sinônimos da palavra Negro é sempre algo degradante, inferior e sinistro. Olhe a palavra Branco, é sempre algo puro, superior e limpo. SIM! EU SOU NEGRO E TENHO ORGULHO DISSO! EU SOU NEGRO E SOU BONITO” _ Martin Luther King – Discurso no Youtube: Tenho Orgulho de Ser Negro
“A hierarquia racial é parte das camadas que estruturam a pirâmide de privilégios que fazem parte da cultura e da sociedade. No topo está o homem branco, seguido pela mulher branca. Só depois aparece o homem negro e, por último, a mulher negra.” Texto: Você é racista – só não sabe disso ainda – Por Túlio Custódio.
“...por último, a mulher negra”. A MULHER NEGRA é a mais atingida pelo racismo, aqui quero focar no empoderamento feminino negro, que possui um significado coletivo. Trata-se de empoderar a si e aos outros e colocar as mulheres negras como sujeitos ativos de mudança. O empoderamento necessário. Mulheres negras sempre lutaram pelo seus espaço na televisão, cinema, futebol etc. Hoje crianças crescem com representatividades como Beyoncé, Oprah Winfrey, Rihanna e no Brasil temos Taís Araujo, MC Soffia, MC Carol, Preta Gil, Elza Soares... dentre as milhares de mulheres negras que mudaram a história do Brasil temos nomes de pessoas como a Ruth de Souza, Alzita Nascimento, Zezé Mota, Pinah Ayoub e Luciana Lealdina. Mulheres negras de ontem e de hoje que fizeram e fazem a diferença numa sociedade extremamente machista e racista.
Racismo Reverso: É a ideia de que o Negro estaria sendo racista contra um Branco quando defende seus direitos. Negros não possuem poder nas instituições para serem racistas. Para explicar de forma bem “simples” essa falácia encontrei um stand up do humorista Aamer Rahman:
“Eu acho que existe racismo reverso, e eu poderia ser um racista reverso, seu eu quisesse: Eu precisaria de uma máquina do tempo. E eu entraria na minha máquina do tempo, voltaria ao período anterior à colonização do mundo pela Europa, convenceria líderes da África, Ásia, Oriente Médio e América do Sul a invadir e colonizar a Europa, ocupá-los, roubar sua terra e recursos naturais. Estabelecer algum tipo de, sei lá, comércio de escravos, explorar mão de obra branca em gigantescas plantações de arroz na china. [...] É claro, com o tempo eu me asseguraria de criar sistemas para privilegiar negros e pardos em toda oportunidade social, política e econômica imaginável e os brancos não teriam nenhuma esperança verdadeira de autonomia. E a cada 20 anos eu inventaria alguma guerra falsa como uma desculpa para bombardeá-los de volta à idade da pedra e diria que é para o bem deles, porque sua cultura é inferior. E só pela diversão, submeteria os brancos aos padrões negros de beleza até que odiassem a cor de sua pele, olhos e cabe los[...]" _ Aamer Rahman
Video no Youtube:
A luta por redenção do povo negro continua. Eu e você temos que continuar essa luta por todos os nossos antepassados que foram escravizados e por todos os que hoje em dia são vitimas de racismo, não se cale diante dessas atitudes, precisamos bater nessa tecla, por o dedo na ferida. Lutar sempre por aqueles que vão de graça pro presídio, para debaixo do plástico, pro subemprego e pros hospitais psiquiátricos.
“Enquanto a cor da pele for mais importante que o brilho dos olhos, haverá guerra”, Haile Selassie.
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